25.7.11

Análise semiótica em netnografias de marca


Héber Sales

A análise semiótica é um dos métodos mais úteis para interpretar os dados coletados em netnografias de marca e descobrir os fundamentos do valor semiótico da marca. Há várias abordagens possíveis. Uma das mais produtivas é a técnica do quadrado semiótico, um antigo recurso lógico que remonta a Aristóteles e que tem sido usado na semiótica contemporânea especialmente por Greimas e seus adeptos.

O caráter opositivo da organização do sentido

O quadrado semiótico baseia-se na premissa de que os signos definem-se mutuamente por oposição (SAUSSURE, 2006). O significado da cor "verde" só se torna claro quando, no âmbito de determinado texto - que, em semiótica, pode ser um romance, um filme, uma fotografia, ou até mesmo comportamentos e rituais -, essa cor é oposta por exemplo ao "cinza" - situação em que o "verde" pode representar a natureza -, ou ao "branco" - neste caso, o "verde" pode distinguir os torcedores do Palmeiras em relação aos torcedores do Corinthians.

Análise semiótica de textos

A análise semiótica inspirada na linguística de Saussure interpreta o sentido de um texto por meio do estudo de tais oposições ou categorias semânticas.

Em um discurso qualquer, as categorias semântica mais importantes são aquelas que constituem isotopias, ou seja, percursos de leitura em que constam os mesmos elementos ou conteúdos (VOLLI, 2003).

O caráter frugal de uma determinada pessoa poderia ser revelado pela compra recorrente de objetos puramente funcionais, sem adorno, pela busca frequente por opções de lazer simples e por sua postura quase sempre informal, espontânea e discreta quando está em grupo.

Nesse exemplo hipotético, analisaríamos o comportamento humano como um texto. Reconstruiríamos uma categoria semântica - ser "frugal" em oposição a ser "perdulário" - ao identificar as principais isotopias presentes na trajetória de vida do indivíduo e estudar as relações entre elas, "de forma a individualizar os conceitos que reciprocamente se opõem, e que são investidos de valor pelo próprio texto" (VOLLI, 2003, p. 61).

Análise semiótica em netnografias de marca

Quando desenvolvemos netnografias em pesquisas de branding, observamos o comportamento de muitos indivíduos e interpretamos inúmeras menções à marca, das mais variadas fontes. Lidamos, portanto, com um vasto repertório de textos.

Neste caso, a análise semiótica deve propor oposições de caráter mais geral. Procuramos então por isotopias ao longo dos mais variados textos sobre a marca e, na medida em que incorporamos novos dados ao estudo e avançamos na interpretação, questionamos constantemente se as categorias semânticas propostas inicialmente ainda continuam exprimindo o sentido comum à coleção de menções à marca e comportamentos de consumo observados.

Ao final dessa trajetória, deveremos encontrar as chamadas associações de marca, ou seja, significados que um certo conjunto de consumidores atribuem, persistentemente, a uma determinada marca.

Esquema do quadrado semiótico

O quadrado semiótico é um dispositivo que nos permite aprofundar a interpretação de um texto ou de um repertório de textos. Nele, completamos uma categoria semântica qualquer acrescentando à oposição original dois outros termos resultantes da negação lógica dos dois preexistentes.

Se, por exemplo, relacionamos o ritual de "tomar um cafezinho" com amigos à oposição entre liberdade e formalidade, completamos o quadrado semiótico com os termos não-formalidade e não-liberdade - importante observar que a categoria semântica de partida é uma espécie de polaridade cultural, uma representação compartilhada por membros de um grupo social, que é flagrada pelo pesquisador.


Nesse esquema, encontramos quatro diferentes tipos de relação:
  • de oposição ou contrária, relativa à categoria semântica de partida (liberdade -- formalidade);
  • de negação lógica ou contraditória, que se desenvolve ao longo das diagonais (liberdade -- não-liberdade e formalidade -- não-formalidade);
  • a partir da contraditória, obtemos a subcontrária, que vemos no eixo horizontal inferior (não-liberdade -- não-formalidade);
  • finalmente, observamos a deixis ou implicação nos lados verticais (liberdade -- não-formalidade e formalidade -- não-liberdade).
O quadrado semiótico acima delineado nos permite então interpretar nuances no sentido do ritual do cafezinho entre amigos, as quais dificilmente seriam observadas se nos concentrássemos apenas na oposição original.
  • À primeira vista, tomar um cafezinho com um colega do escritório é um momento de liberdade, pois, na hora do cafezinho, as formalidades organizacionais são suspensas.
  • Se, no entanto, a conversa com o colega de trabalho evoluir para uma troca de confidências sobre situações de trabalho delicadas, o ritual não estará mais sob o signo da liberdade. Também não poderá significar formalidade. Estaria então a meio caminho entre ser uma não-formalidade e uma não-liberdade. Talvez fosse melhor interpretar a confidência na hora do cafezinho como um compromisso informal e espontâneo entre amigos.
  • Muitas vezes, ao recebermos visitas em casa, oferecemos um cafezinho. O gesto é um modo de dizer: "fique à vontade, relaxe, vamos conversar". Apesar de ser um convite à não-formalidade, o cafezinho que se oferece às visitas não é necessariamente um signo de liberdade, pois ele não pode ser recusado impunemente - dispensá-lo pode fazer com que o anfitrião sinta-se rejeitado e, a partir daí, mostre-se menos amigo do visitante.
  • Combinar um encontro numa cafeteria não compromete tanto quanto convidar uma pessoa para um jantar: é um momento de não-formalidade e de liberdade.
  • Cafeterias são parte de um tema bem consolidado em nossa cultura, sendo reconhecidas como um ponto de encontro entre pessoas de várias tendências artísticas, intelectuais e políticas. É um ambiente onde se cultiva a livre expressão e a tolerância. Um símbolo de liberdade.

    Cuidados no uso do quadrado semiótico

    Tais análises sobre o significado do "cafezinho" e das cafeterias estão corretas? Outros observadores, com objetivos, trajetórias de vida e referências socioculturais diferentes das minhas, talvez interpretem o costume de outra forma, colocando em questão até a categoria semântica explorada aqui.

    O quadrado semiótico não é, portanto, garantia de exatidão interpretativa: é apenas um recurso útil para organizar a análise de textos e comportamentos. Devemos ter cuidado para não usá-lo mecanicamente, como se a sua mera aplicação nos garantisse as chaves do sentido.

    Na verdade, trata-se de um instrumento que pode ser mais ou menos eficaz de acordo com a competência do intérprete, a qual precisa ser desenvolvida por meio de muito estudo, leitura de análises exemplares, introspecção e exercício prático.

    Leia também: Como fazer uma netnografia


    REFERÊNCIAS:

    GREIMAS, Algirdas J. e COURTÉS, Joseph. Dicionário de Semiótica. São Paulo: Contexto, 2008.

    SAUSSURE, Ferninand de. Curso de Linguística Geral. São Paulo: Cultrix, 2006.

    VOLLI, Ugo. Semiótica da Publicidade. Lisboa: Edições 70, 2003.

    Um comentário: